13.6.05

Obrigada Eugénio

Morreu hoje um dos grandes nomes da poesia contemporânea Portuguesa, foi para mim uma perda de vulto, sentia-o tão perto de mim na sua escrita, como se fôra da família.
O exercício de recordar Eugénio, é indissociável da minha juventude e da forma inusitada como tomei conhecimento da sua escrita.
Corria o ano de 1979, e eu era uma adolescente inconformada, que escrevia poemas “lamechas” de amores impossíveis, e dores atrozes de alma, a raiar o desespero...em contrapartida, tinha a mania que era “freak”, que era fixe passar as tardes nas tascas a beber vinho branco e a fumar umas cigarradas, acompanhada de gente mais velha que eu, pelo menos uns 7 ou mais anos, achava “nice” que me tratassem por mascote e que rissem das minhas piadas que – embora não o recorde – teriam concerteza uma qualidade e piada, duvidosas...enfim, aquelas parvoeiras que nos dão na adolescência.
No meio deste marasmo, o meu lado curioso devorava tudo o que fosse novo e estivesse “in”, apesar de quase não pegar nos livros, que a maior parte nem possuía, no Liceu as coisas iam correndo sem sobressaltos, e eis que a minha professora de português é substituída por aquela que eu achei na altura :”a stôra mais fixe do mundo”, teria 20 e poucos anos, vestia-se como eu e, quanto a mim, o mais fixe: vivia numa República...e ainda por cima, uma das mais tradicionais de Coimbra, a República de Prakistão.
Para além das aulas, era excepcional no convívio connosco estava no nosso bar, e tratava-nos como adultos, não era condescendente como a maioria dos profes.
Em conversa calhou a poesia e ela gostava muito, e eu na minha ingenuidade até lhe mostrei os meus poemas, coisa que não fazia a ninguém; quando me lembro agora até sinto vergonha, coitada de mim pensava que escrevia bem...
Por acaso tomou conhecimento de que eu fazia anos, e ofereceu-me um livro que ainda conservo, com a capa suja e já meio torto de tanto ser lido: Ostinato rigore, Escrita da terra e Outros epitáfios, e eu fiquei deslumbrada com aquela escrita tão simples, mas tão plena, com tão poucas palavras contendo tantos sentimentos, e pela primeira vez, tive pena de ser pobre e não poder comprar toda a sua obra, queria sorvê-lo, embeber-me nas suas palavras, viver a poesia das suas frases...
Nunca mais larguei o Eugénio, continuo a sorvê-lo com a mesma avidez, de tal forma o admiro que escolhi um excerto de um seu poema, para escrever nos brindes que ofereci no meu casamento: “...poupar o coração é permitir à morte, coroar-se de alegria...”
Obrigada Eugénio por teres dedicado à escrita, a tua vida e a teres partilhado com todos nós.

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